— Sai agora deste quarto e vai ajudar tua mãe, seu moleque inútil!
A voz embriagada do pai ecoou como um trovão. Bruno, um adolescente de 15 anos com corpo de homem feito, engoliu o orgulho. Sabia que desobedecer significaria uma surra — e, por mais humilhante que fosse apanhar naquela idade, a vergonha de chegar à escola marcado era pior. Levantou-se com um suspiro pesado e foi até a cozinha, onde a mãe, mãos trêmulas, lhe entregou um balde com sabão.
“Inútil é você, seu bêbado miserável”, pensou, esfregando o azulejo do banheiro com raiva contida. Marcos, seu pai, desde que perdera o emprego na empresa de segurança, afundara num poço de frustração. O mercado estava saturado de ex-vigilantes como ele, e os bicos em lojas mal pagavam o álcool que ele consumia. A mãe, frágil como um pássaro ferido, complementava a renda com serviços de limpeza — quando não se entupia de calmantes para fugir da realidade.
Naquela manhã, enquanto pesquisava para um trabalho escolar, Bruno encontrara um trecho na Wikipedia que lhe grudara na mente:
“Tirem suas braçadeiras, soldados. Viva a independência, à liberdade e à separação do Brasil!”
Dom Pedro I, espada em punho, libertando o país do jugo português. A imagem o eletrizou. Mal podia esperar para contar à mãe — sua única aliada.
Ao chegar em casa, porém, o pai já estava à mesa, o rosto rubro de bebida.
— Lava essa cara antes de comer, aqui não é chiqueiro!
— Pai, só vou contar uma coisa pra mãe e já…
— CALA A BOCA! Enquanto não bota um trocado nessa casa, obedece!
O sangue de Bruno ferveu: — Eu faço tudo o que mandam! E cuidar da família é SUA obrigação!
O tapa veio como um chicote, atingindo-o entre a orelha e o pescoço. A mãe se interpôs, mas Marcos a derrubou com outro golpe. O som do corpo dela batendo no chão ecoou como um baque surdo.
— Vou te ensinar a respeitar teu pai, vagabundo!
Bruno não pensou. Correu até o quarto dos pais, revirou o guarda-roupa e encontrou o que procurava: a pistola, sempre no mesmo lugar, sob uma pasta de documentos.
Quando voltou, a mãe sangrava no chão. Ele ergueu a arma.
— Solta ela. Ou eu atiro em você, seu escroto! E não duvide de mim…
Marcos riu, os dentes manchados de cachaça.
— Bandidinho! Nem sabe carregar essa… — O disparo cortou o ar…
O pai olhou para o peito, onde um vermelho vivo se espalhava. Caiu de joelhos, depois de bruços. A mãe gritou, agarrando a arma das mãos do filho, mas era tarde. Enquanto os paramédicos carregavam o corpo, Bruno ficou parado, o zumbido no ouvido ainda ecoando. Na mente, apenas uma frase, repetida como um mantra:
“Independência ou morte.”