O problema do etarismo nas artes, especialmente nas artes visuais e no audiovisual, é uma questão que vem ganhando cada vez mais relevância, mas que ainda parece longe de ser resolvida. A recente entrevista de Stênio Garcia à revista “Quem” trouxe à tona uma discussão crucial: a invisibilidade e a desvalorização de artistas mais velhos em um mercado que prioriza rostos jovens e esteticamente padronizados. Suas críticas à dramaturgia atual, que “não sabe mais escrever para as pessoas velhas”, refletem um cenário preocupante, onde a experiência e a maturidade artística são frequentemente ignoradas em prol de uma suposta renovação que, na verdade, esconde uma profunda falta de diversidade e representatividade.
O etarismo nas artes visuais e no cinema é particularmente evidente. A indústria cultural, especialmente a televisiva e a cinematográfica, ainda opera sob a lógica de que a juventude e a beleza convencional são os únicos atributos válidos para conquistar o público. Isso resulta em uma marginalização de artistas mais velhos, que, apesar de sua vasta experiência e talento, são frequentemente relegados a papéis secundários ou estereotipados. Stênio Garcia, com sua trajetória impressionante e reconhecida, aponta para essa realidade ao mencionar a dificuldade de encontrar trabalhos que valorizem sua expertise e a falta de constância no mercado audiovisual. Sua fala sobre “não se deixar leiloar por menos do que valemos” é um alerta importante sobre a desvalorização profissional que muitos artistas enfrentam, especialmente aqueles que não se encaixam no padrão de juventude perpetuado pela elite dominante dessas artes.
O filme “A Substância”, que fez referência ao tema, aborda justamente essa obsessão pela juventude e pela beleza, explorando de forma crítica e muitas vezes perturbadora como a sociedade e os veículos midiáticos pressionam os indivíduos a manterem uma aparência jovem a qualquer custo. O longa-metragem, que mistura elementos de horror e sátira, revela os efeitos devastadores dessa pressão, tanto física quanto psicologicamente. Ao fazer isso, o filme não apenas critica o culto à juventude, mas também questiona os padrões de beleza inatingíveis que são impostos, especialmente às mulheres, mas também aos homens, como sugere a fala de Stênio sobre a dificuldade de encontrar papéis significativos para artistas mais velhos.
A valorização excessiva da juventude nas artes visuais e no audiovisual não apenas limita as oportunidades para artistas mais velhos, mas também empobrece a própria arte. A diversidade de idades traz consigo uma riqueza de experiências, perspectivas e narrativas que são essenciais para uma representação mais autêntica e plural da sociedade. Quando a indústria prioriza apenas rostos jovens, ela perde a chance de explorar histórias profundas e complexas que só a maturidade pode oferecer. Além disso, reforça estereótipos prejudiciais, como a ideia de que envelhecer é algo a ser evitado ou escondido, em vez de celebrado como parte natural da vida.
Stênio Garcia, ao afirmar que já “ganhou todos os prêmios” e que não tem mais pressa, parece consciente de seu valor e da importância de sua contribuição para a arte. No entanto, sua crítica aos colegas que “não sabem o que estão fazendo” também revela uma frustração com a falta de preparo e comprometimento de alguns artistas mais jovens, que muitas vezes são privilegiados pelo sistema em detrimento de profissionais mais experientes. Essa dinâmica não apenas desvaloriza os veteranos, mas também compromete a qualidade artística das produções.
Em suma, o etarismo nas artes é um problema estrutural que precisa ser enfrentado. A mídia em geral deve reconhecer a contribuição de artistas de todas as idades. É necessário que haja uma mudança concreta nesse atual “modus operandi”. Por isso, perguntamos: Qual será o futuro das artes se continuarmos a ignorar a experiência e a maturidade desses artistas? Até quando a indústria do audiovisual vai perpetuar padrões de beleza que excluem a diversidade etária? Que ações urgentes esta precisa tomar para combater o etarismo e valorizar a contribuição de todas as gerações? Essas perguntas carecem de respostas urgentes, e nós, consumidores de arte, precisamos cobrar das autoridades, em todas as esferas, na área da Educação e Cultura, que repensem esse modelo e pressionem os produtores a reverem os conceitos. Afinal, a arte é um reflexo da humanidade em todas as suas etapas, e negar o envelhecimento é negar uma parte fundamental da nossa existência.
Esta publicação também está disponível no jornal A Tribuna, na edição do dia 19/02/2025, na página A2. Você pode acessar a versão em PDF pelo link: A Tribuna – Edição 13557.