Teodoro, o Tatu, estava de boa na lagoa — ou melhor, na sua toca lá nos Cafundós do Judas — quando uma notícia lhe subiu às ventas como cheiro de esgoto em dia quente: seis repórteres da ESPN haviam sido demitidos. Não por incompetência, não por ‘fake news’, mas por ousarem fazer o que qualquer jornalista com um pingo de coragem deveria fazer: criticar o presidente da CBF.
— Ué, mas desde quando jornalista que faz jornalismo vira problema? — indagou Teodoro, já afiando a língua e lustrando sua couraça azul com faixa branca.
A resposta veio logo: desde sempre, no Brasil. Aqui, a liberdade de expressão é igual promessa de político em campanha — bonita no papel, mas desaparece mais rápido que Wi-Fi de prefeitura.
Vestiu sua indignação como se fosse smoking e rumou à Capital da Nação. Queria entender como uma entidade privada, mas com cheiro de estatal mal lavada, como a CBF, ainda conseguia controlar tanta coisa, inclusive quem pode ou não trabalhar na mídia esportiva.
— Excelência, ouvi dizer que criticar o chefão do futebol agora dá justa causa. Procede? — perguntou Teodoro ao Mandatário Supremo da Ordem e do Caos.
— Veja bem, Tatu… liberdade de expressão é importante, mas desde que não atrapalhe os negócios. E a imagem da CBF é um patrimônio nacional! — respondeu o Excelentíssimo, enquanto borrifava perfume francês nas mãos engomadas com cheiro de golpe.
— Então quer dizer que agora jornalista tem que fazer cafuné institucional em cartola pra manter o emprego?
— É isso, meu caro. Aqui, o jornalismo esportivo é como juiz de VAR: só pode falar o que o patrão quer ouvir. Senão, é vermelho direto. Mas, como já te pedi: não espalha, certas coisas são mais bem assimiladas quando não são ditas explicitamente.
Teodoro entendeu o recado. O Brasil continua sendo aquele lugar onde o poder não se contenta em mandar: ele quer aplauso, reverência e até massagem nos calos. Criticou? Tá fora. Questionou? Tá queimado. Mostrou a verdade? Tá cancelado — mas sem chance de ‘comeback’ no BBB.
Foi então que Teodoro decidiu investigar mais a fundo. Ele descobriu que os repórteres demitidos não falaram nada demais. Só apontaram que a gestão da CBF era, no mínimo, nebulosa — coisa que até o VAR enxergaria, mesmo com catarata. Mas num país onde a transparência é tão opaca quanto vidro fumê de camburão, a verdade virou ofensa pessoal.
Ele encontrou um dos jornalistas demitidos, agora vendendo água na porta do estádio. O sujeito sorriu amarelo, com os olhos de quem tinha apanhado de cassetete ideológico.
— Tatu, se arrependimento matasse, eu teria elogiado a grama do campo em vez de falar da lama na diretoria.
E é isso. Num Brasil onde o dono da bola também é dono do apito, da transmissão e da verba de publicidade, a imprensa se torna refém da bajulação. Não é que não se possa criticar — é que não se pode fazer isso e continuar empregado. Censura moderna, versão 5G, agora com Wi-Fi e café na recepção.
Teodoro, então, voltou para sua toca. Mas antes, deixou um bilhete para os brasileiros, colado no poste mais próximo da esquina:
“Enquanto a caneta dos poderosos continuar sendo usada para apagar vozes e não para escrever justiça, o Brasil vai seguir cavando — não o futuro, mas seu próprio buraco para se enterrar cada vez mais.”
E foi ele também cavando, cavando… até desaparecer no horizonte, junto com os últimos vestígios de um jornalismo que ousava dizer a verdade.