O Censo de 2022 revela um avanço inegável: mais brasileiros estão chegando ao ensino superior. No entanto, esse progresso esbarra em uma realidade dura e persistente: as desigualdades raciais e sociais continuam a moldar o acesso aos cursos mais prestigiados e caros, como Medicina e Engenharia, onde brancos ainda são a maioria esmagadora. Enquanto isso, a educação básica, alicerce fundamental para qualquer mudança estrutural, segue negligenciada. E a pergunta que fica é: até que ponto políticas como as cotas raciais resolvem o problema, e onde elas se tornam apenas ferramentas políticas ou até mesmo alvo de golpes?
As cotas raciais foram um passo importante no combate às desigualdades históricas. Elas abriram portas que antes estavam fechadas para negros, pardos e indígenas, permitindo que muitos jovens tivessem acesso a universidades públicas de qualidade, coisa que sequer sonhariam em anos anteriores. No entanto, as cotas não são uma solução mágica. Elas não resolvem, por exemplo, a deficiência na educação básica, que impede que muitos estudantes cheguem ao ensino superior com a preparação necessária para competir em pé de igualdade com quem fez cursinho desde seu ingresso na escola, e têm acesso a ótimos colégios. Além disso, as cotas não garantem que, uma vez dentro da universidade, esses estudantes tenham o suporte adequado para concluir seus cursos. Muitos abandonam a graduação por falta de condições financeiras ou por não conseguirem acompanhar o ritmo exigido, e esse dado o Censo não aponta.
Outro ponto crítico é a instrumentalização política das cotas. Em alguns casos, elas são usadas como bandeira eleitoral, sem que haja um compromisso real com a melhoria da educação como um todo. Há ainda quem se aproveite do sistema de cotas para fraudes, como o caso de pessoas que se declaram negras ou pardas sem sê-lo, apenas para garantir uma vaga. Esses desvios não invalidam a importância das cotas, mas mostram que elas são apenas uma parte de um quebra-cabeça maior. Usando de um trocadilho: o caso das cotas não deve ser apenas encarado nos matizes preta ou branca, como querem alguns políticos mal-intencionados, a fim de gerar controvérsias e angariarem votos. Existe um gradiente entre essas cores que tem de ser pensado, discutido e proposto, com a intenção de beneficiar a população e graduá-la para um futuro de cidadão útil à nação.
Para além das cotas, é urgente investir na educação básica. O Brasil gasta mais com o ensino superior do que com a educação infantil e fundamental, o que é um contrassenso. Enquanto países desenvolvidos investem pesado nos primeiros anos de vida das crianças, o Brasil ainda patina em metas como a universalização da creche e da pré-escola. Mas, investir na educação básica não é algo que dá retorno imediato pois não gera manchetes nem votos fáceis. É um projeto de longo prazo, que exige paciência e compromisso com o futuro, e isso desanima sobremaneira políticos comprometidos apenas com os bolsos e nada com o povo. É preciso garantir que todas as crianças tenham acesso a creches de qualidade, professores bem remunerados e infraestrutura adequada. Só assim será possível romper o ciclo de desigualdades que persiste há séculos.
No ensino superior, a qualidade também precisa ser prioridade. O crescimento dos cursos à distância (EAD) é um reflexo da necessidade de expandir o acesso, mas não pode ser sinônimo de ensino precário, senão fica patente a intenção eleitoreira de quem cria, ou alimenta, esse tipo de programa. É preciso garantir que estes cursos ofereçam formação relevante e capacitação real, preparando os estudantes para os desafios do mercado de trabalho real e exigente. Além disso, as universidades precisam oferecer suporte financeiro e psicológico para alunos cotistas e de baixa renda, ajudando-os a concluir seus cursos com dignidade.
Enquanto isso, as cotas continuam sendo uma ferramenta necessária, mas insuficiente. Elas são um remendo em um sistema que precisa de uma reforma completa. E, como todo remendo, podem desgastar com o tempo se não forem acompanhadas de mudanças mais profundas. O desafio é grande, mas não há atalhos. A educação é a chave para um país mais justo, e essa chave precisa ser forjada com investimento, planejamento e, acima de tudo, vontade política. Que tal começarmos a cobrar essa vontade no ‘quintal de nossa casa’, vendo o que pode ser, e o que tem sido feito no âmbito Municipal? Com certeza essa faceta da nossa cidadania já ajudará em muito a melhora dos pontos levantados acima, e que possamos, mais do que nos classificar alfabetizados, sermos realmente cidadãos prestantes e úteis à sociedade em geral.
📰 Esta publicação também está no jornal O Democrata!
Nosso artigo foi publicado na edição do dia 08/03/2025 do jornal O Democrata, na página 6.
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Tema relevante que deve ser levado para o debate público, mas que fica cada vez mais difícil devido a polarização que o país se encontra, onde o único prejudicado é o pagador de impostos.